Para tornar as corridas mais divertidas, o melhor é variar o cenário e submeter o seu corpo a diferentes esforços e movimentos. Convém, contudo, conhecer as características, as vantagens e desvantagens do solo que pisa para aproveitar o melhor de cada um deles e tomar precauções, tendo em conta as dificuldades e irregularidades dos terrenos. Neste artigo, iremos forcar-nos nos benefícios e dificuldades de correr na areia.
De uma forma geral, e sem pensar em areia molhada ou seca, os benefícios de correr na praia são:
- perder peso
- definir as pernas
- ajudar a combater a celulite
- melhorar o equilíbrio
- fortalecer o sistema imunitário
- melhorar o humor
É diferente correr na areia molhada ou na areia seca e, dependendo do caso, optar por correr neste tipo de piso tem vantagens e desvantagens. De qualquer forma, para os amantes da corrida, correr na praia significa a oportunidade de diversificar a superfície de treino.
Correr na areia: calçado ou descalço?
A maioria das pessoas não utiliza qualquer tipo de calçado, sendo, assim, o contacto com a areia (seca ou molhada) feito diretamente com a planta do pé. Nos últimos anos, a corrida sem calçado ou com calçado minimalista tem conquistado entusiastas entre os desportistas. Ao correr na praia poderá ter um primeiro contacto com esta modalidade, sem o risco de abrasão cutânea causada por outras superfícies como o alcatrão.
Apesar de controverso, será sempre melhor correr calçado pelos seguintes motivos:
- é mais proveitoso e benéfico;
- protege os pés e sobrecarrega menos joelhos, anca e coluna;
- protege dos objetos que podem ser encontrados na areia como tampas de garrafas, partes de vidro e conchas.
No entanto, e porque passamos o ano inteiro com os pés calçados, o que faz enfraquecer várias estruturas dos mesmos, existem vantagens de correr na praia sem calçado para contrariar essas tendências, ou seja:
- estimular o tornozelo, o arco do pé e dedos;
- despertar/ativar músculos com o objetivo de os fortalecer;
- prevenir, de certa forma, lesões.
O mais indicado seria, então, fazer inicialmente pequenas atividades lúdicas na praia, sem calçado, de forma a preparar, estimular e fortalecer os pés. A combinação ideal passará, então, por atividades descalço e corrida com calçado.
Vantagens da corrida em areia seca
A corrida/marcha em areia seca tem sido utilizada em protocolos de reabilitação de lesões desportivas por atenuar as forças de impacto ao solo e trabalhar outros aspetos, como a perceção do próprio corpo. Assim, a corrida em areia pode melhorar a consciencialização da posição do pé, por não existirem as estruturas da planta do pé que nos informam sobre a posição e a superfície de apoio.
Risco de dores musculares
O padrão de recrutamento muscular em corrida na areia seca é diferente do habitual (alcatrão ou relva), com maior ativação dos músculos dos compartimentos posterior e interno da perna. Esta particularidade contribuiu para o desenvolvimento de dores musculares depois da corrida, sobretudo nos primeiros treinos e se a duração/distância forem excessivas. Uma forma de contrariar este risco é iniciar com corridas curtas e fazer alongamentos musculares após cada sessão, sobretudo dos gémeos e músculo solear.
Correr na areia permite desafio adicional
Para uma velocidade idêntica, a corrida em areia seca corresponde a um maior dispêndio energético. Para o mesmo tipo de exercício (“sprints”, treino de agilidade, etc), atingem-se frequências cardíacas mais elevadas e há uma maior perceção de esforço na areia, em comparação com outras superfícies como a relva. Uma superfície mais “suave”, menos estável e com menor retorno de energia elástica, obriga a um maior esforço por parte do atleta. Assim, a corrida em areia seca permite um desafio adicional ao corredor habitual ou uma experiência diferente ao atleta principiante.
Os riscos da corrida em areia molhada
A corrida em areia molhada, mais compacta, é mais semelhante à corrida em outras superfícies mais “duras”. Assim, pode existir o risco de sobrecarga das estruturas do pé, sobretudo em atletas que fazem o impacto ao solo com a parte posterior do pé (calcanhar) e transmissão de forças para a coluna vertebral. Podem surgir dores na planta do pé, compatíveis com a inflamação da fáscia plantar, uma estrutura de tecido conjuntivo que apoia o arco interno do pé, desde o calcâneo até aos metatarsos. No entanto, se o atleta conseguir fazer o impacto ao solo utilizando mais a porção média e anterior do pé, poderá “amortecer” o impacto, fazendo um contacto mais rápido com o solo e, ao mesmo tempo, fortalecer os músculos intrínsecos do pé.
Sabia que…
Além das lesões de sobrecarga já mencionadas, correr na areia pode causar traumatismos nos dedos dos pés. Pode ocorrer uma flexão plantar exagerada da articulação metarsofalângica no contacto ao solo, mais frequentemente do primeiro dedo de pé, podendo haver uma lesão ligamentar e do tendão extensor do dedo – sand toe.
Além das lesões acima descritas, podem ainda surgir:
- tendinites do joelho
- entorses do joelho e tornozelo
- lesões meniscais
A fisioterapia pode ajudar e orientar numa fase inicial de preparação do indivíduo para o início da atividade, a corrida. Ou seja, pode melhorar a capacidade muscular, a flexibilidade, o equilíbrio, a resistência ao exercício e adaptação/resposta a diferentes tipos de pisos. Pode ainda ajudar na correção postural que interfere diretamente com o desempenho da corrida e prevenção de lesões.
A fisioterapia terá sempre um papel fundamental no tratamento de qualquer lesão proveniente da corrida.
Cuidados a ter ao correr na praia:
- Correr no início da manhã ou no final da tarde, quando a temperatura está mais amena;
- Usar uma boa sapatilha de corrida, que absorva o impacto e que seja maleável (ao correr na areia dura);
- Levar uma garrafa de água ou de uma bebida isotónica para repor os líquidos e sais minerais perdidos no suor;
- Passar protetor solar em todas as áreas expostas ao sol, para evitar lesões na pele;
- Usar chapéu ou boné e óculos de sol para proteger o rosto e os olhos.
Falámos com João Catalão – osteopata, atleta e cliente da Physiohub – sobre a sua experiência em corrida na praia.
Elisa Figueiredo: Tens por hábito correr na areia?
João: Em condições normais, corro uma vez de 15 em 15 dias na Costa de Caparica, entre a praia de São João e a Fonte da Telha.
Correr na praia com ou sem calçado?
Tenho por hábito correr calçado de maneira a evitar golpes na pele.
Concordas com a ideia de que a corrida em areia seca é um desafio?
É, sem dúvida, um desafio, pois exige que o atleta tenha uma boa resistência aeróbia e uma superior capacidade de trabalho de força nos membros inferiores.
Correr na areia molhada, seca, ou nenhuma opção?
Quando corro na praia, faço-o em contexto de treino contínuo lento, optando por fazê-lo na areia húmida e plana, de maneira a reduzir o impacto muscular e tendinoso.
Na tua opinião e experiência própria, qual o contributo que a fisioterapia pode dar para quem corre, seja a nível amador como profissional e no que toca à preparação e manutenção?
Em traços gerais, reconheço um papel importante da fisioterapia na prevenção de lesões, pois o seu trabalho estimula a obtenção de ganhos no campo do equilíbrio, da consciência corporal no espaço e na capacidade de produção de força.
Quais seriam os teus conselhos para quem quer começar a correr.
O cenário ideal seria procurar um profissional do treino de corrida, que possa elaborar um plano de acordo com as capacidades/metas do atleta em questão,um fisioterapeuta, que consiga identificar e trabalhar lacunas físicas que poderão ficar mais expostas no processo da corrida e conduzir a lesões, e um nutricionista, que prescreva um regime alimentar condizente com as necessidades e o estilo de vida da pessoa.
Texto da autoria da Fisioterapeuta Elisa Figueiredo.